Por Soraya Goulart
DÁ-ME
DE COMER: A ASSISTÊNCIA SOCIAL ESPÍRITA
Ficha
Catalográfica:
Dá-me
de comer: a assistência social espírita: SIMÕES, Pedro. São Paulo: Edição CCDPE
/ LHIPE, 2015.
Preço na
LIVRARIA YVONE DO AMARAL PEREIRA: R$ 50,00.
Dá-me
de comer, de Pedro Simões, é um exemplo belíssimo da nova
geração de livros de cunho científico e espírita que têm chegado ao mercado neste
século XXI, através das Universidades (Academia). Ao contrário dos livros
ditados pelos espíritos (psicografia), muito comuns no século passado, os
atuais são fruto da pesquisa (teoria) e da trajetória profissional (prática) dos
seus escritores, num processo de acúmulo de conhecimentos e de reflexões, que
une os legados da Doutrina Espírita a determinado campo do saber – no caso aqui
específico, o Serviço Social e a Sociologia.
Simões discute o “modo
espírita” de fazer assistência, amparado na leitura da Doutrina e de teóricos
reconhecidamente aceitos, a fim de elucidar se existe uma “coerência” entre a
proposta e a forma de atuação (p. 22). Ressalta a importância das Federações
Espíritas (Brasileira e Estaduais) no trabalho de imprimir-se um padrão de
assistência social no País.
Os primeiros
questionamentos voltam-se para um ponto primordial: “Por que a população
assistida não é atendida por profissionais com qualificação específica para os
fins sociais? Por que se concebe que qualquer pessoa pode atuar na área da
assistência social?” (p. 27) – perguntas concernentes a quaisquer atividades
que se querem produtivas, independente da área de ação, e que remetem às bases
de um novo ponto de vista sociopolítico-cultural que permeia a
contemporaneidade:
A assistência
social moderna não é tão somente uma forma de ajuda entre aqueles que têm para
aqueles que não têm. Ela envolve uma forma de garantir a integração social
evitando a dissociação, ou seja, criando vínculos. (...) Neste momento, a
assistência não está relacionada, exclusivamente, à existência da pobreza
enquanto tal, ou seja, de indivíduos com menos recursos do que exigido pelo seu
tempo, mas à necessidade de a sociedade ter de oferecer, pela primeira vez, uma
resposta social para o desamparo de uma quantidade cada vez maior de
indivíduos” (SIMÕES, 2015, p. 43).
Com isso, Simões coloca
em cheque o “individualismo” intrínseco a certos programas sociais e, em contrapartida,
chama atenção para a existência de outros parâmetros que não o da lógica do
favor (paternalismo e tutela).
Em geral, a inserção do
voluntário no serviço assistencial se dá pelo desejo de “ajudar”, de “fazer a
caridade”, entendida em seus dois sentidos: o material e o de exercício do
amor, abarcando termos como “inclusão, promoção, cidadania, direito”. No
discurso espírita, assistência e caridade estão claramente relacionadas:
A diferença que
as separa está em que, entre os religiosos, além da ação de auxílio, amparo,
promoção, elevação do ser, que envolve a assistência, há também o viés
religioso que associa à ação os sentimentos de amor, dedicação, ‘sentimento
puro’, renúncia, dedicação ao próximo, entre outros. Esse é, exatamente, o
caráter religioso da assistência social espírita, uma vez que os elementos que
a compõem não são passíveis de se traduzirem em salário: aqueles que operam
profissionalmente a assistência social são pagos para executarem um trabalho
técnico, o que subentende uma ‘neutralidade’ de valores (p. 169).
O livro traz um
levantamento praticamente completo de todas as segmentações envolvidas no
trabalho social espírita: traça o perfil dos trabalhadores e dos participantes;
apresenta os documentos doutrinários (programas e serviços) que regulamentam as
ações; descreve tanto as atividades institucionais quanto as assistenciais; lista
fontes de financiamento e de possíveis parcerias para encaminhamentos (Conselho
Tutelar, hospitais, Escolas etc.).
Enfim, nada fica de
fora nessa análise profunda do tema, o que o torna imprescindível para todos os
que se oferecem em trabalho dentro dos Centros Espíritas, independente da área.
É uma desconstrução de teorias repetidas “no automático”, que não mais condizem
com as novas demandas do mundo contemporâneo.
“Fazer assistência
social e espiritual não é o mesmo. É possível associá-las e os espíritas
procedem assim. No entanto, o fazem sem a clareza de distinção entre ambas. A
demanda por questões sociais refere-se a elementos que a vinculam à pobreza e
aos vínculos sociais. (...) Os assistidos que chegam às casas espíritas buscam
recursos para as suas necessidades materiais, não para sua fé (p. 231)”,
esclarece Simões, apontando contradições que reproduzem comportamentos paternalistas,
além de providenciarem um “apaziguamento” de consciências que desejam a própria
“salvação”.
Como todo
cientista político, Simões evita emitir juízos de valor, no sentido de dizer o
que “serve” e o que “não serve”; contudo, ao dissecar procedimentos e contradições,
possibilita aos que militam no campo do social fazerem uma autoavaliação para
redirecionarem ou não seus objetivos.
Se Jesus disse “Não
somente de pão viverá o homem, mas de toda palavra que sai da boca de Deus”,
qual seria a razão do título do livro? Ela surpreende pelo ineditismo da
abordagem! Mas esse ponto só será elucidado por aqueles que se dispuserem a romper amarras e se aventurarem em páginas tão profundas quanto
saborosas!
Boa leitura a todos!
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